domingo, 2 de agosto de 2009

Grande Sertão: Veredas, de João Guimarães Rosa

Seção: Isto é Literatura
(...)
Semelhante não foi, quando um homem, Rudugério de Freitas, dos Freitas ruivos da Água-Alimpada, mandou obrigado um filho dele ir matar outro, buscar para matarem, esse outro, que roubou sacrário de ouro da igreja da Abadia. Aí, então, em vez de cumprir o estrito, o irmão combinou com o irmão, os dois vieram e mataram mesmo foi o velho pai deles, distribuído de foiçadas. (...) E enqueriram o cadáver paterno em riba da casa – casinha boa, de telhas, a melhor naquele trecho. Daí, reuniram o gado, que iam levando para distante vender. Mas foram logo pegos. A pegar, a gente ajudou. Assim, prisioneiros nossos. Demos julgamento. Ao que, fosse Medeiro Vaz, enviava imediato os dois para tão razoável forca. Mas porém, o chefe nosso, naquele tempo, já era – o senhor saiba -: Zé Bebelo!
(...)
Os dois irmãos responderam que tinham executado aquilo em padroeiragem à Virgem, para a Nossa Senhora em adiantado remitir o pecado que iam obrar, e obraram dito e feito. Tudo que Zé Bebelo se entesou sério, em pufo, empolo, mas sem rugas em testa, eu prestes vi que ele estava se rindo por de dentro. Tal, tal, disse: - “Santíssima Virgem...” E o pessoal todo tirou os chapéus, em alto respeito. – “Pois, se ela perdoa ou não, eu não sei. Mas eu perdôo, em nome dela – a Puríssima, Nossa Mãe!” – Zé Bebelo decretou. – “O pai não queria matar? Pois então, morreu – dá na mesma. Absolvo! (...) – “Perdoar é sempre o justo e certo...” – pirlimpim, pimpão. Mas, como os dois irmãos careciam de algum castigo, ele requisitou para o nosso bando aquela gorda boiada, a qual pronto revendemos, embolsamos. E desse caso derivaram também uma boa cantiga violeira.
– p. 91/92

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