quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

"Qual é a alma do cinema?", por Arnaldo Jabor

Seção: Você pode saber mais!

Muita gente chega para mim e diz: “Como é?... Você não vai voltar a fazer cinema?” “Sei lá”, respondo. E penso: “Que cinema? Comercial, metafísico, político, experimental? O quê?” (...) Tenho saudades do cinema, sim, justamente nesta época em que as imagens inundam nossos olhos e ouvidos. Mas tenho saudades de outro cinema, da fragilidade dos filmes antigos e da ideia do “objeto único” a que eles almejavam. (...)
Atualmente, a cinefilia soa quase como um vício sexual; talvez tenha sido. Há um mundo secreto, próprio do cinema, que só alguns ainda conhecem. Hoje o cinema é nu. Está exposto nas lojas, feiras e bancas de jornais, está nas TVs, está rodando bolsinha nas ruas. Mas, se eu reclamo dessa profusão, dizem: “Ahh, qual é a tua, cara? Isso é bom para o cinema, aumenta a difusão no mercado etc. e tal.” Talvez, talvez, mas tenho saudades da sala escura, do cinema dos pobres tímidos, do cinema como ilusão solitária, realidade alternativa que analisávamos noite adentro nos bares. Como era bom esperar um filme do Fellini, e o novo Antonioni, e o novo Godard... (...)
Naquela época, o cinema ainda tinha a tal “alma” que hoje desapareceu nos supermercados e videoclubes. (...) “Creio que o cinematógrafo será útil para sabermos, no futuro, como os antigos se moviam...”
Talvez seja esta a “essência” do cinema: registrar a morte comendo a vida.
(...) – p. 77, 78, 79, 80.

Pornopolítica: paixões e taras na vida brasileira / Arnaldo Jabor. Rio de Janeiro: Objetiva, 2006.

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